Devido à semelhança com as
disputas por guarda e visita de crianças e adolescentes, animais domesticados
não podem mais ser classificados apenas como coisas ou objetos. Devem ser
reconhecidos como membros de um núcleo familiar.
Esse foi o entendimento da 7ª
Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo ao reconhecer que
as varas de Família são competentes para solucionar questões relativas à guarda
e à visita de animais de estimação.
O processo analisado envolve um
casal que vivia em união estável e, durante o período sob o mesmo teto,
adotaram um cachorro. Com o término do relacionamento, a mulher ficou com a
posse do cão, e passou a impedir que o ex-companheiro tivesse acesso a ele.
Na ação de reconhecimento e
dissolução da união estável, a Defensoria Pública pediu a posse compartilhada e
a regulamentação de visitas em relação ao cachorro, porém o juízo de primeira
instância julgou extinta a ação sem resolução de mérito, por entender que se
tratava de questão estranha à vara de Família.
A defensora pública recorreu, sob
o argumento de que os animais adentraram no âmbito de convivência e proteção
das famílias, sendo considerados verdadeiros integrantes do núcleo familiar.
Os desembargadores da 7ª Câmara
aplicaram, por analogia, o disposto no Código Civil acerca da guarda e visita
de crianças e adolescentes. O relator, juiz em segundo grau José Rubens Queiróz
Gomes, comentou que, com base em pesquisa recente do IBGE, é possível afirmar
que há mais cães de estimação do que crianças em lares brasileiros.
Ele também apontou lacuna
legislativa, pois a relação afetiva existente entre seres humanos e animais não
foi regulada pelo Código Civil de 2002, que fala que “os animais são tratados
como objetos destinados a circular riquezas (artigo 445, parágrafo 2º),
garantir dívidas (artigo 1.444) ou estabelecer responsabilidade civil (artigo
936)".
Como a lei não previu como
resolver conflitos entre pessoas em relação a um animal adquirido com a função
de proporcionar afeto, e não riqueza patrimonial, Queiróz concluiu que cabe ao
juiz “decidir de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de
direito, nos termos do artigo 4º da Lei de Introdução às Normas de Direito
Brasileiro”.
"Considerando que na disputa
por um animal de estimação entre duas pessoas após o término de um casamento e
de uma união estável há uma semelhança com o conflito de guarda e visitas de
uma criança ou de um adolescente, mostra-se possível a aplicação analógica dos
artigos 1.583 a 1.590 do Código Civil", escreveu o relator.
Ele ressaltou ainda que,
diferentemente do que acontece com filhos, "a guarda e as visitas devem
ser estabelecidas no interesse das partes, não do animal, pois o afeto tutelado
é o das pessoas". O voto foi seguido por unanimidade.
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